Embora a fome seja um estado somático, uma necessidade fisiológica, comer pode proporcionar não só saciedade, mas também prazer, satisfação e a possibilidade do encontro e o estabelecimento de um vínculo de confiança. Ao alimentar um bebê ou criança pequena, estamos oferecendo também segurança, confiança, aconchego e aprendizado. Fazemos de 4 a 5 refeições por dia que podem ser tanto prazerosas quanto uma triste obrigação ou um tormento terrível.
Por volta dos seis meses, quando a criança deixa de ser alimentada apenas com o leite do peito ou com a mamadeira e tem início a introdução aos alimentos, a criança começa a desenvolver o paladar experimentando o que é doce, amargo, azedo, ácido, salgado, etc. E os alimentos também têm cor, cheiro, textura e sabor. Um mundo inteiro de sensações e experiências novas se abrem para os bebês.
Comer de forma independente e civilizada é um dos elementos chave da socialização. Há muitos aprendizados a serem conduzidos pelo adulto nesse processo, são eles: beber utilizando um copo, comer com uma colher, mastigar, não sujar a própria roupa ou a mesa e não perturbar os companheiros.
Como a Abordagem Pikler se preocupa muito com as transições, cuidando para que sejam suaves e não tragam estranhamentos ou dificuldades desnecessárias, uma das práticas dentro dessa abordagem é fazer a introdução da papinha no colo, na mesma posição em que o bebê é amamentado.
O colo é um ambiente de calor, intimidade, segurança, contato visual, troca afetiva e conforto. O bebê amamentado no peito ou na mamadeira está acostumado a ser alimentado no colo. Como a introdução da papinha já é em si mesma uma mudança significativa nos hábitos da criança, manter a criança no colo diminui o estranhamento e facilita o processo de introdução alimentar.
Para alimentar o bebê no colo, é preciso preparar a fruta ou papinha que será oferecida, colocar uma almofada em um dos braços de uma poltrona ou cadeira com braço, apoiar bem os pés no chão, o educador (ou mãe) deve acomodar a si mesmo e ao bebê de forma confortável no seu colo, tendo ao lado uma mesa de apoio com os utensílios necessários. Se a papinha for colocada em uma vasilha funda ou copo fica mais fácil para segurar e oferecer ao bebê.
O bebê pode ser alimentado desta forma até que aprenda a se sentar sozinho, sem nenhum apoio por volta dos 8 ou 9 meses. No cadeirão, muitas vezes a criança se sente presa e obrigada a comer, no colo isso não acontece, e geralmente, a criança come melhor.
Segundo a Abordagem Pikler, a forma como a alimentação acontece influencia diretamente na qualidade do relacionamento entre a criança e o adulto. As aquisições e progressos não deveriam ser medidos pela idade cronológica, mas sim, pela possibilidade de adultos e crianças terem bons momentos juntos.
Fatores que colaboram para uma boa refeição:
- A criança é quem decide o quanto quer comer. A introdução alimentar pressupõe tempo para experimentação. Não é importante a quantidade, mas sim a qualidade.
- O cuidador de referência, quem normalmente cuida da criança, é a pessoa indicada para fazer a introdução alimentar, pois é quem conhece seus hábitos e gostos
- Para que tenha sentido e significado a interação não deve ser mecânica ou apressada
- Não forçar ou impor nada
- Ouvir e observar o momento certo para propor mudanças ou introdução de novos passos na alimentação
- A decisão é do adulto, a competência da criança
Para estabelecer um clima de cooperação, nós nos ajustamos ao ritmo e velocidade de cada criança
- O quanto levantar a colher?
- Qual o tamanho da porção a ser oferecida?
- Qual a rapidez com a qual dar a próxima colherada?
- Algumas crianças gostam de comer devagar e confortavelmente
- Outras se tornam impacientes se não recebem o alimento rapidamente
- A mesma criança altera o seu ritmo de tempos em tempos
Para facilitar o processo, podemos:
- Aquecer ou esfriar a papinha
- Diluir com água
- Tornar mais doce
- Mudar a ordem na qual a comida é oferecida
- Primeiro tomar um pouco de leite na mamadeira
- Comer uma fruta ou suco primeiro
- Quando a criança ainda não se adaptou a colher, podemos oferecer a papinha em um copo
- Devemos nos permitir voltar atrás, se for necessário
Evitar o que podemos chamar de pseudo-ajuda:
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- Deixar que a criança que ainda não tem habilidade coma sozinha
- “Mostrar” como se faz pegando a mão da criança e fazendo por ela
Ajudamos quando:
- Deixamos que a criança experimente
- Orientamos diversas vezes como segurar a colher
- Ensinamos a não mergulhar muito fundo a colher e a não virar a colher ao contrário quando chega na boca
Quando a refeição acontece muito lentamente e a criança se torna impaciente porque não consegue aplacar a fome, o método das duas colheres pode ser útil. A criança e o adulto usam cada um uma colher e o adulto oferece algumas colheradas entre as colheradas que a própria criança faz.
É melhor oferecer pequenas porções, desta forma a comida se manterá quente e gostosa na panela ou recipiente tampado, aumentando a chance de que o bebê ou criança pequena coma mais e melhor. Normalmente, as crianças comem devagar e a comida acaba esfriando no prato, o que faz com que a criança se desinteresse pelo alimento.
Segundo a Abordagem Pikler, jamais deveríamos dar uma colher a mais que não seja aceita com satisfação.
Apetite é o desejo de comer determinado alimento, diferente de fome que é uma necessidade somática. Quando uma criança come com voracidade, com gula, devemos compreender que este é apenas um sintoma que indica alguma frustração, da mesma forma que acontece com os adultos que buscam consolo na alimentação. Regular a alimentação da criança, diminuindo as porções, no entanto, não traz resultados positivos, muitas vezes apenas pioram a situação. É necessário investigar e tratar as causas da frustração para eliminar o sintoma.
Bibliografia
Association Pikler-Lóczy Budapest 2007 – “Bringing up and providing care for infants and toddlers in an isntitution” Print Bt. Hungary
Associación Pikler-Lóczy de Hungría 2018 – “Claves de la educación Pikler-Lóczy” – Compilación de 20 artículos escritos por sus creadoras Elena Herrán (Editora)
IGNÁCIO, R. K. – 2002. “Aprendendo a andar, aprendendo a confiar – O desenvolvimento da criança pequena segundo Emmi Pikler” Edições Mainumby.
Abordagem Pikler, relata uma observação que já trazia com migo, a troca entre adultos e crianças no momento tão íntimo da alimentação. A negação com seu gesto no balança a cabeça confirmando que já está saciado e o respeito do adutora ao não persistir na colherada.
No momento da alimentação é se conectar com a afetividade e a socialização entre as partes, como os bebês e as crianças e a professora ou educadores.
Isso mesmo, Maria José. A Abordagem Pikler nos confirma o caminho respeitoso e adequado para lidar com a introdução alimentar.
Sim, Lolina. O vínculo transforma a introdução alimentar em um momento respeitoso e prazeroso.